quinta-feira, 19 de julho de 2012

PORQUÊ SE ESTÁ VIVO – O VALOR DA PSICOTERAPIA


Uma das propostas deste blog é dialogar sobre a Psicologia, sobre Psicanálise, sobre Psicoterapia, enfim, sobre pessoas – sobre coisas que estão a serviço das pessoas.

Tomarei aqui a Psicoterapia (dentre as outras citadas, porém estas exercem função equivalente) para dizer que ela está a serviço da possibilidade de se criar espaços onde a pessoa possa “ser”, “não-ser”, “constituir”, “construir”, “desconstruir”, “transformar”, “perceber”, “escolher”, “pensar”, “enxergar”, “nascer”, “morrer”, “amar”. De fato verbos impossíveis cabem dentro de uma psicoterapia.
            Ela deve ousadamente pretender ser espaço que suscite e que “permita” algum tipo de autenticidade, e nesta mesma perspectiva (da pretensão e de “algum tipo de”) favorecer a “voz” das pessoas, o silêncio delas, o olhar delas sobre os seus conteúdos (sejam eles organizados, desorganizados, esvaziados ou inexistentes). Considero que se uma ação ou um processo psicoterapêutico puder oferecer “estas circunstâncias” ele já possui grande valia, destacando-se que estas circunstâncias propiciarão coisas que precisam ou podem ser construídas “depois”.  

            Não posso dizer que “adiei” ou “posterguei” um texto sobre psicoterapia ou psicologia no blog, afinal referencio para algumas coisas da minha vida não o tempo pós-moderno – este tempo onde nunca há tempo - mas um tempo onde a gente pode ter um tempo. Posso afirmar sim que “anunciei” textos como este logo da criação deste blog – e isso tem algum tempo.
Quero considerar também que falar do que é a psicoterapia e, mais ainda, do seu valor, traduz-se numa tarefa muito ampla.
            é possível que qualquer narrativa não contemple a riqueza, a singularidade, a profundidade desta prática profissional, deste processo pessoal (para o paciente), desta experiência pela qual, como costumo dizer, não se passa sem algum tipo de marca (boa), alguma “pincelada”, algum registro no inconsciente.
            Eu sei que já vivi, enquanto psicoterapeuta, momentos que eu diria “brilhantes”.
Expressões, silêncio, palavras, lágrimas... momentos. Momentos em que “há saltos”, que naquela caminhada conjunta entre psicoterapeuta e paciente há uma compreensão, que tanto pode aparecer através de uma intervenção do psicoterapeuta, quanto do “insight” do paciente, ou mesmo através de alguma coisa que o paciente conseguiu sentir ou vivenciar na sua “vida” cotidiana (porque afinal há de se lembrar que a psicoterapia não é feita para dentro da clinica, ou qualquer outro espaço de atendimento, mas para a vida do sujeito – para lá fora).
            Eu gostaria de poder ter comigo em absoluto todas essas lembranças profissionais, todos esses momentos de saltos e de vôos das pessoas “fotografados” em minha memória... mas alguns os tenho, outros não... Entretanto, de qualquer forma trata-se de instantes muito sutis e que tem o seu valor selado na transformação para a vida da pessoa, interna e externamente.

            Antes um pouco falei sobre uma “caminhada conjunta” e sobre uma “compreensão”, que é conjunta também. Na psicoterapia não existe um papel que seja o mais importante. O psicoterapeuta não é a pessoa mais importante desta relação, alias a relação é o mais importante. As expressões “caminhada conjunta” não foram empregadas despropositadamente. A psicoterapia é um trabalho árduo e que depende da execução ativa do psicoterapeuta e do seu paciente – é preciso que haja um compromisso consciente entre ambos para se construir um processo que tenha nos seus horizontes frutos satisfatórios ou quiçá deliciosos.
            Freud nos ensinou que o ser humano é movido pelo “principio do prazer”, no entanto a condição humana é assegurada pela renuncia de alguns “prazeres” ou pelo deslocamento das “pulsões” para outros “objetos”. Em suma, pessoas maduras aceitam que não e possível ter tudo o que se deseja, tudo o que se quer, mas que é necessário ter o que se precisa verdadeiramente.
            A psicoterapia vai de encontro a esta premissa e por isso falei de “frutos satisfatórios”. A psicoterapia tem que dar o que a pessoa precisa. Se “de quebra” puderem ser colhidos frutos deliciosos e isso é totalmente possível – que caminho bom foi trilhado!
            ...O adulto maduro compreende que existem perdas, frustrações, limites, interditos, renuncia, rejeição. Quando ele compreende isso também aceita que ele próprio pode errar e penso que ai se cria um clima de leveza, de generosidade para consigo.
            A pessoa “terapeutizada” entende que dá pra ser feliz com um pouco de infelicidade, que dá pra enfrentar com um pouco de fragilidade, que dá pra vencer com oportunidades diminuídas, que dá pra construir coisas mesmo tendo dentro de si espaços muito vazios, que dá pra prosseguir porque se está vivo.

            Eu pretendia escrever outras coisas no inicio: “Pra que serve uma psicoterapia?”, “Quando fazer psicoterapia?”, “Como acontece a psicoterapia?”... Falar sobre alguns aspectos técnicos, sobre duvidas que percebo serem comuns entre as pessoas. Porem, percebo, como diria Camilo Coelho Branco, que “a coisa tocou o seu fim”, o texto caminhou para a sua finalização, então cabe a mim em respeito ao ritmo das palavras, parar, pois creio que elas sinalizem também para ate onde os leitores prefeririam chegar. Igual praia, tem hora que a gente quer ir pra casa tomar banho no chuveiro. Outro dia a gente volta pra praia, mas tudo permanece continuo.

             Espero que fique aberto este convite, o interesse pela psicoterapia.
            Mais que isso: espero que você tenha vontade de fazer psicoterapia, que você navegue nessa praia.
            Fazer psicoterapia não é dizer que se freqüenta uma psicólogo, um psicoterapeuta, um analista, ou que se vai numa clinica “chique” da cidade, que se “paga caro”... Não. Psicoterapia é um processo de vida, para a vida, onde as coisas que se vivenciam lá são ao mesmo tempo um recorte e um “tudo” do mais importante – é a própria vida.
            Contrariando a minha característica acadêmica e pedagógica de procurar “explicar” todas as coisas mencionadas, neste texto não me propus a fazê-lo para que os “não-entendidos” provoquem interrogação e alguma busca. Penso que vivemos num tempo aonde muitas coisas já vem “explicadinhas”, “certinhas”, com “receitas encontradas na internet”. Na minha opinião isso nos aprisiona e tudo que menos precisamos é isso. Vamos “ser”, vamos “não-ser”, vamos “nos escolher”, vamos “seres”.

 

"Caminhando contra o vento
Sem lenço e sem documento
No sol de quase dezembro
Eu vou..."
(Caetano Veloso)


 
Thereza Erika
19 de julho de 2012, Tangará da Serra-MT.